Sempre me consultam sobre como devem ser calculados correção monetária e juros de mora nos processos judiciais previdenciários. E a confusão é realmente grande, pois em 2009, a Lei 11.960, numa redação muito mal feita, determinou que se utilizasse os mesmos índices das cadernetas de poupança para todos os processos em que a Fazenda Pública fosse ré.

O problema é que poupança não tem correção monetária: ela recebe a variação da TR, que não mede inflação. Por este motivo, muitas ações foram ajuizadas questionando a constitucionalidade da Lei. Estas foram reunidas no Tema 810, no STF, que foi julgado em 29.09.2017, com o seguinte resultado:

DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART. 5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal supramencionado.

2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.

[…]

4. A correção monetária e a inflação, posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços.

Como se pode ver, a TR foi claramente declarada inidônea para fins de atualização monetária de valores devidos. Considerando a inidoneidade da aplicação de tal indicador – ou, como disposto em tal decisão, a inconstitucionalidade desta parte do Art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09 – volta à vigência a regra anterior (Lei 11.430/06), que previa a utilização do INPC, a partir de 09/2006. Quanto aos juros de mora, prevaleceu a interpretação que, em casos não tributários, a utilização dos mesmos indicadores aplicados aos depósitos em cadernetas de poupança é legal.

Antes que se argumente a modulação de efeitos das ADI 4357/DF e 4425/DF, é de fundamental importância lembrar que aquelas ações se limitaram a discutir a correção monetária e juros de valores já inscritos em precatórios. Tanto é verdade que, justamente por este motivo, a União prosseguiu na discussão, através do RE 870.947/SE (que originou o Tema 810), questionando exatamente o critério de correção monetária e juros a ser aplicado aos valores antes de sua inscrição em precatório.

O Superior Tribunal de Justiça também se pronunciou a respeito do mesmo tema, no REsp 1.492.221. O Acórdão ainda foi publicado na noite do dia 27.03.2018, nestes termos:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A CONDENAÇÃO JUDICIAL DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. 

• TESES JURÍDICAS FIXADAS.

1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza.

1.1 Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária. […]

1.2 Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão.

A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório.

2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária.

3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.

3.1 […]

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

3.3 […]

É importante lembrar que o Manual de Orientação de Procedimento para Cálculos na Justiça Federal, versão 2013, já contempla as regras acima; logo, seguindo tal Manual, os cálculos estarão corretos.

Um abraço, e até a próxima!